sábado, 13 de junho de 2015

OUVI-ME VÓS






                           “No Dia de Santo António”

Vendo tão grande aridez
Nos homens de alma vazia
Frei António duma só vez
Fez jus à sabedoria.

Deixou praças foi ao mar
À praia os peixes chamou
E com um mágico pregar
Fez sermão qu´ os encantou.

“Irmãos peixes, meus irmãos,
Tenho que vos confessar
Meus argumentos são vãos
Para os homens conquistar.

É tal a humana loucura
Que em todos já fez cegueira
E toda a reles criatura
Põe a Deus na prateleira.

Em cada dia que passa
Nos mais escassos momentos
Vemos um mundo sem graça
Rodeado de tormentos.

Todo o poder instaurado
Passa ao lado das verdades
Cada projecto engendrado
É uma feira de vaidades.

Para eles só há negócio,
Esquecem Deus o tempo inteiro,
Nem casamento nem divórcio
Só um Deus: o seu dinheiro.

Vós, porém, com toda a estima,
Viveis bem e tomais tino,
Sois de Deus a obra-prima
E conheceis o vosso destino.

Mas sois filhos da natureza,
Não vos podeis esquecer,
Que entre vós, com certeza,
O mesmo pode acontecer.

Os mais de vós sois pequenos,
Tendes migalhas e pouco mais,
Se não conheceis os terrenos
Sereis carne pr´ os demais.

Quando temeis sois cardume
Fica-vos bem a união
Os maiorais têm ciúme
Puxando p´ ra si a razão.

Vós, peixes, sempre quereis
Da vida tirar proveitos
Mas os fortes, como sabeis,
Tomam conta dos direitos.

Abri bem os vossos olhos
E refreai vossas escamas
Para escapar aos escolhos
E ao perigo das tramas.

E vós, ó peixes maiores,
Que vos julgais invencíveis
Destruí vossos horrores
Pois também sois perecíveis.

Para os oceanos bem fundos
Levai a vossa tirania
Perante os fracos sois imundos
E não julgueis ter valentia.

Há redes para os pequenos
E pr´os maiorais há arpões
Contai c´os humanos venenos
Que vos matam as ilusões.

Há mares baixos e estreitos
E há imensas maresias
Há sargaços e há defeitos
E ninguém vê serventias.

Peixes de todos os tamanhos,
Iguais mas sempre diferentes,
Não queirais por entre estranhos
Serdes comidos p´ las gentes.

Não sei que mais vos direi
Apenas que sejais felizes
Convosco a Deus pedirei
Para vos livrar dos deslizes.

Acreditai nas esperanças
Dos mares azuis de bonança
E p´ ra terdes águas mansas
Uni guelras sem tardança.

C´ os homens nada a fazer
Pois qu´ o bem já não os seduz
E, quanto ao como devem ser,
Preferem as trevas à luz.

Coitada da Natureza,
A terra, o mar e o ar,
O homem é uma tristeza
Vós, Peixes, sois d´ encantar!”

Frassino Machado
In JANELAS DA ALMA


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